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Porcelain2Doll — A Boneca de Porcelana- Parte 1
Published: 2007-10-30 00:23:39 +0000 UTC; Views: 478; Favourites: 2; Downloads: 3
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Description E ela seguiu, levando consigo um caderno, um bico de pena, seu relógio de bolso e suas luvas brancas, constantemente brancas. Suspirando.
“Não tenho nenhuma idéia”
Sem idéia não haveria a festa, e, sem festa, continuaria triste, observando o sol adentrar por suas janelas e a noite virar manhã, um dia após o outro. Por isso seguiria seu plano, firme, mesmo sentindo aquela dorzinha fina no coração, mesmo sentindo vontade das lágrimas escorrerem face abaixo.
E, lá foi ela, boneca de porcelana, em contraste com a paisagem esfumaçada da cidade, seus saltos faziam um barulho baixo nas pedrinhas da rua, levava seu caderno comprimido nervosamente junto ao busto. O bico de pena, preso entre as espirais do caderno, fazia um barulho tão leve quanto seus passos.
Passava por muitas pessoas, uma vez ou outra tentava pedir uma ajuda, mas todos seguiam direto, sem nem olhar, ou olhando do alto, “frios”, ela disse entre os lábios formando um bico tristonho.
Ajeitou o bico de pena nas espirais, subindo-o, de volta ao começo de sua fuga para fora do caderno, ajeitou a postura, subindo-a, tentando parecer com o resto do mundo frio e passivo, e tentou ajeitar o sapato, tropeçando, de joelhos no chão. Ela largou o caderno no meio da queda, indo ao chão, para deixar os braços livres a apará-la, e sentiu o relógio de prata saltar dentro de seu bolso, assim como seu coração em seu peito. Rapidamente ela se endireitou, ajoelhando-se e limpando as luvas sujas, agora, de terra. As pessoas frias que passavam olhavam sádicas, com risadinhas e sorrisos sádicos. “N... não doeu”, tentou falar para os outros, fingindo ser mais forte que sua camada de porcelana poderia permitir ser. Ninguém disse nada, apenas continuaram passando e olhando sadicamente; seus olhos marejaram, sentia vergonha de si.
Era uma boneca de porcelana, frágil, num mundo rígido e cruel, onde qualquer coisa poderia quebrar lhe o coração e machucar sua pele.
Então, uma jovem se aproximou a passadas rápidas, porém devagar, porém curiosa. A jovem chegou um pouco mais perto dela e lhe estendeu a mão, a boneca de porcelana, espantada, abriu a boca, enxugou as lágrimas e, catando suas coisas do chão, aceitou a ajuda.
“Está bem?”, a jovem perguntou.
Ela vestia um vestidinho vermelho, com muitas rendinhas, e morangos bordados na barra, não era muito adulto e nem muito infantil, seus cabelos escorriam em cascatas de cachos pelos seus ombros.
“Sim.”, ela falou rapidamente, tímida.
“As pessoas daqui não ajudam muito, estão muito ocupadas com suas vidas, acho que a poeira daqui do centro da cidade que meche com o coração delas, deixando-os negros.”, a jovem disse olhando fixamente para ela; a jovem não era do tipo de pessoa que se distrai gesticulando o que fala, e observando ao redor para ver se a censuravam, como se tivesse medo de que achassem errado o que dissesse, do contrário, ela realmente colocava em questão o que pensava, ou, ao menos, fora dessa forma que a boneca imaginou que a Jovem fosse.
“Obrigada. Por reparar em mim e vir me ajudar...”, ela disse baixinho, fazendo bico com sua boca pintada de batom.
“Meio difícil não reparar em você, é muito bonita, pena ser muito inocente, as pessoas podem lhe ferir muito facilmente.”, disse a Jovem.
“Ah. Sim, obrigada...”, ela falou apesar de não entender porque uma pessoa poderia querer ferir outra, ela realmente não compreendia o que era esse sentimento.
As duas pararam por um momento, a boneca ficou olhando para seus sapatinhos vermelhos, tentando achar um bom momento para perguntar à Jovem por uma fantasia; já a Jovem ficou olhando a sua volta, refletindo.
De repente, a Jovem virou-se como se fosse embora, a boneca percebeu e apressada levantou o rosto, com medo de que sua única chance de alguma idéia se esvaísse. E, novamente de forma repentina, a Jovem virou-se de volta a olhar para a boneca e disse, sorrindo: “quer vir comigo até minha lojinha?”, e deu uma piscadela simpática.
A boneca ficou espantada com a atitude doce da garota, como podia ela, tão doce, morar num lugar daqueles?
Ela sorriu e resolveu seguir a Jovem.
Não precisaram andar mais que alguns poucos metros para chegarem à porta de uma lojinha diferente, ela não tinha nome, no lugar do nome havia apenas dois morangos, e era completamente colorida, verde, rosa, vermelho, branco e um azul aqui e ali. Aquela lojinha era tão diferente das outras lojas, escuras e com persianas quebradas, era como achar um anjo achar aquela Jovem e sua loja.
A Jovem pegou uma chave dentro do bolso, perto da barra de seu vestido, e abriu a porta da lojinha, a boneca, sem saber ao certo o que fazer, esperou envergonhada uns instantes e logo a Jovem a convidou cordialmente a entrar.
“Quando estava vindo abrir a lojinha é que a vi.”, e foi até a porta para virar a plaquinha de “fechado” para “aberto” e depois em direção ao interruptor, clareando todos os cantos, impedindo que aquela escuridão das outras lojas se repetisse dentro daquela.
Quando a Jovem acendeu as luzes que ela pode ver o que era vendido lá, na tal lojinha, morangos e tudo relacionado a eles. Havia caixinhas adornadas com morangos, trabalhados na madeira, havia panos de prato com morangos pintados, havia blusinhas com estampas de morangos e botões de morangos, e havia, o que não poderia faltar, morangos, embalados em caixinhas de plásticos, vermelhos e doces, sem o menor sinal daqueles machucadinhos que morangos costumam a ter.
A Jovem pegou uma das caixas de morangos e ofereceu à boneca.
“Desculpe, estou sem dinheiro...”, ela disse baixinho apertando o caderno contra o busto.
“Não, não precisa pagar. Esta loja não é um negócio muito lucrativo, uma vez ou outra me pego comendo os morangos que estão à venda, não há problemas em você comer alguns.”
E, então, a boneca pegou um morango e o levou à boca, estava realmente doce, mais que a aparência poderia dizer. A Jovem sorriu novamente, de um jeito meigo que só ela fazia naquela cidade, e, pegando um morango, disse:
“Eles são uma dádiva, não acha?”, e a boneca fez que sim com a cabeça, respeitando a educação em não falar de boca cheia, especialmente quando está cheia de morangos. “Nessa cidade a minha lojinha é a única que vende morangos, ou, melhor, a única que vende morangos que não são amargos e estragados.” E a Jovem deu uma risadinha, “Morangos são difíceis de cuidar e, se não o fizer bem, eles estragarão com uma tremenda facilidade. As pessoas daqui não acham morangos muito interessantes e não tem paciência para cuidar deles, então, eles amargam. Talvez seja por isso que elas não são muito alegres, morangos deixam nossa vida docinha, fazem bem para a alma, soa estranho, mas é o que eu acho.”
A boneca fez que sim com a cabeça, novamente, parecia mesmo que faltavam morangos na dieta daquelas pessoas, porque, no fundo, a Jovem tinha razão, apenas em comer uns dois morangos a boneca já se sentia bem, apesar dela não saber se era por serem morangos ou por serem aqueles morangos.
“As pessoas dessa cidade parecem que tomam limões...”, ela disse baixinho e fazendo uma cara tristonha. Ela não sentia raiva daquelas pessoas, sentia pena delas por não serem felizes, no fundo, igualmente a razão da Jovem em relação aos morangos, elas não eram mais felizes que a boneca, eram tão tristes quanto.
A Jovem riu, “Você tem razão! Parecem mais que comem limões!” e ofereceu outro morango a ela. As duas se silenciaram, a boneca estava comendo outro morango e a Jovem estava distraída refletindo novamente.
“Você parecia triste e desnorteada no meio daquelas pessoas, há algo em que eu possa ajudar?”, a Jovem disse, finalmente, depois de um silêncio enervante.
A boneca parou por um pouco e pensou em como deveria usar as palavras, da maneira mais delicada possível, afinal a Jovem era muitíssimo gentil.
“Eu estava procurando alguém que me desse uma idéia para a fantasia.”, ela falou imaginando ter escolhido bem.
“Fantasia, qual fantasia?”, a Jovem perguntou parecendo até intrigada, não tola.
A boneca corou, havia usado o artigo errado. Ao invés de um artigo indefinido, o que faria mais sentido para a Jovem que não sabia do que se tratava a tal fantasia, ela usara um artigo definido, como se já tivesse uma fantasia em mente, o que era completamente o oposto da situação.
“Perdão, usei o artigo errado!”, ela se apressou em dizer, exaltada, “Eu gostaria de ter dito ‘uma fantasia’ ao invés de ‘a fantasia’. Eu estava procurando alguém que me desse uma idéia para uma fantasia.”, ela tratou de repetir a frase palavra por palavra, corrigindo o primeiro erro.
“Ah, sim, claro, eu quem entendi errado. Deixe me pensar... uma fantasia?”, e a Jovem sorriu meigamente, se fosse outra pessoa qualquer daquela cidade teria rido dela e da maneira um pouco infantil de corrigir o erro da frase.
A Jovem fez a mesma cara que fazia quando refletia distraidamente, e, da maneira repentina dela, disse: “morango! Você ficaria linda de morango!”
A boneca franziu o cenho, não entendia a mania que a Jovem tinha por morangos, mas acabou sorrindo, talvez ela ficasse bonitinha de morango. E pegou seu caderno, abriu na primeira página em branco, escreveu a primeira idéia: “morango”, a Jovem suspirava enquanto havia voltado a refletir.
“Todavia, não sei se você gosta tanto de morangos quanto eu, então, talvez fosse melhor você escolher algo que demonstrasse mais o que sei coração quer dizer.”, a Jovem disse parecendo meio triste por sua idéia não ser a ideal. As duas pararam para refletir.
“O que... meu coração quer dizer?”, a boneca perguntou baixinho, olhando para os sapatos vermelhos, meio tristonha. A boneca não sabia o que seu coração queria dizer, ela não sabia porque tudo que ele queria, naquele momento, era uma companhia melhor que a solidão, e era só isso que ele dizia, todo o tempo, tentando explicar por dores fininhas e pontadas que parecia matá-lo.
A Jovem reparou no rosto infeliz da boneca voltado para o chão.
“M... mas eu não sei o que ele quer dizer...”
Então, repentina, como sempre, a Jovem se aproximou e abraçou a boneca delicadamente, para não quebrar sua porcelana. A boneca sentiu seu coração aquecer e dizer algo, baixinho, bem baixinho. Sem a solidão machucando-o, ele conseguia falar, mas de uma maneira quase muda, estava muito ferido para se esforçar.
“Você irá ouvi-lo.”, e foi só isso que a Jovem soube dizer, nem ela mesma saberia ao certo como agir naquela situação e sentia muita pena de ver a boneca assim, pois, sendo inocente como ela era, seria uma tarefa muito complicada e desventurada ouvi-lo claramente.
As duas ficaram abraçadas por um tempo, e, então, a boneca entendeu que era melhor ir, procurar pelo o que seu coração queria dizer. A Jovem desfez o abraço que envolvera a boneca, deu um passo atrás, e elas se despediram. A boneca voltou às ruas da cidade, olhando para dentro da loja, onde lá sorria a Jovem. Fez um aceno e se foi.
A Jovem ficou lá observando o curioso contraste daquela criatura de roupa branca com o cenário de pessoas de ternos pretos, sorrindo de maneira meiga, sorrindo de maneira solitária a Jovem. Talvez a boneca nunca soubesse, mas a Jovem sabia que sua solidão era tanta quanto a que ela sentia, entretanto a Jovem a combatia de sua forma, comendo doces morangos todos os dias, uma mania que só ela compreendia.
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Comments: 2

Plumdora [2008-12-24 16:47:36 +0000 UTC]

Muito fofo. Tem alguns errinhos, mas acredito que isto seja bem mais antigo, pq vc evoluiu bastante a forma de expressar.
P.S.: isso daria um oooootimo curta a la tim burton hehehe *imaginei assim*

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TSMedina [2007-11-03 22:09:00 +0000 UTC]

gostei *

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